No cenário jurídico americano, a tensão política frequentemente se reflete nas disputas legais que envolvem personagens de destaque. Esta foi a situação no último mês, quando a suprema corte dos Estados Unidos decidiu, sem abrir debates, não acolher a apelação de michael cohen, ex-assessor de donald trump, que alegava ter sido alvo de retaliação por parte do ex-presidente após a publicação de um livro crítico. A recusa da corte em revisar o caso mantém as decisões de instâncias inferiores que já haviam descartado o processo de cohen, colocando um ponto final, ao menos por ora, em suas tentativas jurídicas.
Cohen, que ficou conhecido como “o homem que consertava tudo” para trump, moveu a ação judicial em 2021, alegando que a resposta de trump, do ex-procurador-geral bill barr e de outros oficiais federais às suas declarações públicas sobre o livro que escreveu se caracterizava como retaliação. O ex-funcionário, que passou um tempo na prisão devido a uma série de crimes, incluindo violações relacionadas ao financiamento de campanha, alegou que sua liberdade de comunicação foi severamente restringida após ter sido convocado para assinar um acordo que o proibia de falar com a mídia. O que se seguiu, segundo documentos do tribunal, foi que, ao não assinar o referido acordo, cohen foi levado de volta à custódia e colocado em confinamento solitário por mais de duas semanas.
A batalha legal de cohen foi marcada por complexidades e desafios. Ele enfrentou não apenas a recusa da suprema corte, mas também a oposição poderosa de trump e da administração biden. Os advogados de trump descreveram a reclamação de cohen como “totalmente desprovida de mérito”, enquanto o departamento de justiça reforçou que cohen não conseguiu demonstrar de forma convincente que as questões legais levantadas por sua ação eram comuns a outros casos. Essa postura evidencia a dificuldade que um cidadão americano enfrenta ao tentar acionar a justiça contra práticas de agentes federais, um aspecto que já foi definido por um precedente da própria suprema corte em 1971 no caso bivens v. six unknown named agents, que limitou consideravelmente as circunstâncias em que tais ações podem ser movidas.
Não é segredo que a trajetória de michael cohen esteve entrelaçada com escândalos e controvérsias, especialmente durante a campanha presidencial de 2016, onde ele se declarou culpado de nove acusações, incluindo práticas ilegais de financiamento de campanha propiciadas por pagamentos a mulheres. Após cumprir parte de sua sentença de três anos, cohen foi liberado temporariamente em 2020 devido à pandemia de Covid-19, um momento que, ironicamente, deveria ter lhe trazido alívio, mas que revelou-se mais um capítulo conturbado em sua saga legal.
No contexto norte-americano atual, a recusa da suprema corte em ouvir o apelo de cohen não é um caso isolado, mas sim parte de um padrão mais amplo que reflete a intersecção entre política e justiça. A decisão levanta questões sobre a capacidade dos cidadãos de buscar reparação contra possíveis abusos por parte do governo, especialmente em casos em que figuras políticas de destaque estão envolvidas. O que isso propõe é um debate mais profundo sobre a acessibilidade da justiça para cidadãos comuns, especialmente quando confrontados com a máquina do estado. Assim, a história de cohen se torna não apenas um relato sobre um ex-assessor, mas também um símbolo de um sistema jurídico que está em constante tensão com as realidades do poder.
Em última análise, a agitação em torno do caso reflete não apenas as lutas pessoais de cohen, mas também um panorama mais amplo sobre como a lei se aplica a diferentes cidadãos, destacando as desigualdades que podem existir nesse sistema. Para cohen, o que poderia ter sido uma jornada de reivindicação e justiça se transformou em uma batalha que ele, ao que parece, não está mais apto a vencer nas cortes superiores. A suprema corte, ao manter a decisão das instâncias inferiores, parece ter colocado um ponto final em mais um capítulo conturbado em uma saga repleta de reviravoltas que abala as estruturas da política e do direito nos Estados Unidos.