A recente publicação do capítulo mais atual do manga “Shagai Torishimariyaku Shima Kōsaku” de Kenshi Hirokane, na edição número 46 da revista Morning da Kodansha, gerou um incomodo significativo por conta de uma declaração polêmica contida na narrativa. Os criadores do manga, junto à equipe editorial, emitiram um pedido formal de desculpas após a repercussão negativa gerada por uma fala de um personagem que abordou a construção de uma nova base militar dos Estados Unidos em Nago, localizada na província de Okinawa. A menção de que muitos cidadãos locais, supostamente, estavam sendo contratados como trabalhadores temporários para protestar contra a presença das bases norte-americanas despertou reações adversas e acendeu o debate sobre a representação da realidade social e política no mundo das histórias em quadrinhos.
A controvérsia começou quando um personagem do manga comentou sobre a possibilidade de receber um pagamento diário para participar de manifestações contra a construção da base. Essa abordagem, considerado irresponsável por muitos, foi vista como uma tentativa de simplificar uma questão complexa que envolve a presença militar dos EUA no Japão, especialmente em Okinawa, onde bases militares têm sido um catalisador de protestos ao longo das últimas décadas. A equipe criativa, ao produzir esse capítulo, fez uma visita a Okinawa com o intuito de investigar a indústria do turismo local, durante a qual ouviram relatos de residentes mencionando a existência de trabalhos temporários relacionados a essas manifestações. Entretanto, essa informação foi interpretada de maneira errada e apresentada como um fato concreto dentro da história, levando a uma reavaliação da responsabilidade ao lidar com questões tão sensíveis.
A importância das bases militares dos Estados Unidos em território japonês remonta ao Tratado de Segurança EUA-Japão, assinado em janeiro de 1960, que culminou na presença militar americana na região. Desde então, Okinawa tem sido o epicentro de uma série de protestos contra essa situação, refletindo a tensão entre segurança nacional e a vontade popular. Embora a obra de Hirokane se insira em um contexto de ficção, a maneira com que certos temas são abordados pode exacerbar tensões em uma sociedade que já enfrenta dilemas significativos sobre sua autonomia e identidade nacional. Havendo a consciência de que o estilo narrativo pode facilitar a difusão de informações não confirmadas e propagar estereótipos ou generalizações, ficou claro que a equipe deveria ter exercido uma maior cautela em relação ao conteúdo apresentado.
Desde seu lançamento em 1983, o personagem Kōsaku Shima tem acompanhado a ascensão de um executivo japonês em diversas versões de seu trabalho, que foram adaptados para anime, jogos e até mesmo uma série de ação ao vivo. O título mais recente, “Shagai Torishimariyaku Shima Kōsaku”, começou sua publicação em março de 2022, e a franquia em si já possui uma longa trajetória que reflete várias mudanças no ambiente de negócios e no cenário econômico do Japão. Tal continuidade exibe a relevância e impacto da obra de Hirokane na cultura pop japonesa. Apesar do sucesso, a repercussão negativa deste capítulo específico provocou discussões sobre as responsabilidades dos criadores ao retratar a realidade social em suas histórias.
Em uma nota de esclarecimento, a equipe criativa admitiu que o comentário inadequado acerca dos protestos foi um erro e que ajustes serão feitos na versão compilada do manga. Essa alteração ressalta a necessidade de revisar a forma como as histórias são contadas, especialmente quando se toca em questões delicadas que envolvem a vida de tantas pessoas. Em uma era onde a informação se espalha rapidamente e a opinião pública pode ser moldada de maneira instantânea, a responsabilidade que os criadores de conteúdo têm sobre as mensagens que passam se torna ainda mais crítica.
Concluindo, o incidente envolvendo “Shagai Torishimariyaku Shima Kōsaku” serve como um importante lembrete sobre a delicadeza necessária para tratar de temas controversos dentro da arte e da narrativa. A forma como uma história pode influenciar a percepção pública, e vice-versa, deve ser levada em consideração com seriedade, pois a arte não é apenas entretenimento; é também um reflexo de valores sociais e culturais que podem ter um impacto duradouro na sociedade. Assim, a reflexão sobre a responsabilidade criativa continua sendo uma questão imperativa na produção artística contemporânea, e o pedido de desculpas da equipe de Hirokane é um primeiro passo importante para fomentar um diálogo mais consciente sobre a representação na mídia.